A história de Gustave não é muito feliz, é preciso dizer. Na realidade, vivia satisfatoriamente com os pais até que sua mãe engravidou de um segundo filho - algo extremamente proibido em Arcadia. Tentaram ocultar a gravidez pelo maior tempo possível, mas, em um determinado momento, tornou-se impossível para o pai do garoto justificar a ausência de sua esposa em sua função - ela era uma promissora engenheira. Quando descobertos pelas autoridades, estes decretaram: o bebê seria abortado. Inconformado, o pai de Gus ofereceu a sua vida em troca da que estava por vir. Não é possível afirmar que a oferta foi bem recebida, mas o homem estava irredutível, não deixaria o feto morrer sem lutar. E, afim de evitar que a história se espalhasse e gerasse confusão, o chanceler autorizou que o homem fosse expulso da arca...literalmente, jogado no espaço - consequentemente morto.

Se ver a execução de seu pai, por si só, já foi extremamente doloroso, foi difícil para Gustave perder sua mãe meses depois. Graças a um erro médico, a mulher sofreu hemorragia interna e veio a falecer. Felizmente, os médicos conseguiram resgatar o bebê, ao qual foi dado o nome de François, como a mãe já havia relevado ao filho mais velho meses antes. Se já não fosse difícil crescer na arca com os pais lhe dando cuidado, imagine o quão difícil foi para Gus e seu irmão - que acabou ficando inteiramente sobre os seus cuidados - crescerem sem as figuras paternas! Todos esperavam que as crianças se tornassem dois baderneiros, mas esta expectativa não tornou-se realidade.

Gus já havia absorvido muitos dos valores de seus pais antes que estes viessem a falecer, de forma que mesmo depois de sua morte, o garoto tornou-se um rapaz educado, inteligente e dedicado ao seu irmãozinho. É claro que, sem um emprego - já que ninguém empregaria um menino de doze anos sem qualquer habilidade em especial além de uma língua afiada e extremamente convincente -, as condições eram precárias e o que tinham não parecia o suficiente para sobreviver. Dessa maneira, visando melhorar o ambiente para seu irmão, Gustave resolveu entrar para o mercado negro, ainda que a contragosto.

Começou com pouco, pegando coisas das lixeiras e roubando coisas das quais não se perceberia a ausência, as vendendo em seguida ou trocando por coisas que lhes fossem mais úteis. Assim, com o passar dos anos, Gus acabou criando uma lista enorme de clientes - inclusive pessoas que ocupavam grandes postos - e, é claro, tornou-se conhecido, amado/protegido por alguns e odiado por outros. Foi então que, algumas destas pessoas que lhe queriam mau, fizeram uma armação para o garoto, contratando-o para um serviço falso e que o colocou direto nas mãos de policias mais conservadores.

O garoto tentou lutar, alegou que não podia deixar seu irmão sozinho, mas nada adiantou. Foi sentenciado à prisão perpétua. Achou estranho, entretanto, quando na semana seguinte, guardas entraram em sua cela e o vestiram com trajes realmente diferentes daqueles com os quais estava acostumado. Não entendeu o que estava acontecendo até entrar em uma nave onde estavam outros noventa e nove jovens, e o Chanceler anunciou que aquela era uma expedição à terra. Se antes seu desespero por ficar preso e deixar seu irmão sozinho já o deixou aflito, ir para a terra com a expectativa de morrer por lá e deixar François REALMENTE sozinho naquele mundo cruel foi a coisa mais cruel que lhe podiam ter feito. Não pode se despedir, portanto fez o possível para chorar discretamente.

Já na terra, após superar a dor de deixar o irmãozinho para trás, Gus fez logo o possível para ser agradável e se aproximar daqueles que lideravam o grupo. Como alguns já tinham conhecimento sobre suas habilidades de coleta, o rapaz foi recomendado para esta atividade e, assim, faz o possível para realizá-la com afinco. Ao contrário do que se imagina, não, ele não deixou de vender e trocar coisas ilegalmente, mas ali ninguém além dos clientes de sempre poderiam saber, caso contrário, estaria morto.